sexta-feira, 8 de março de 2013

Às Rosas, Dandaras, Olgas e Pagus que vivem em cada um de nós!

O texto abaixo foi escrito no ano passado, também por oportunidade do dia 8 de março. Como, um ano depois, continua atualíssimo, posto-o novamente:

* Artur Pires

Hoje, 8 de março, comemora-se o Dia da Mulher. Uma data para homenagear as mulheres foi pensada pela primeira vez em 1910, durante a  Segunda Internacional Socialista, em Copenhague, na Dinamarca. Em 1917, no dia 8 de março, milhares de mulheres russas saíram às ruas para protestar contra a escassez e o alto preço dos alimentos. Os protestos foram se avolumando nos dias seguintes e hoje são considerados o estopim para o início da Revolução Russa naquele mesmo ano. Quatro anos mais tarde, em 1921, o 8 de março foi oficializado como o Dia da Mulher. Apenas em 1975, a Organização das Nações Unidas (ONU) reconheceu a data oficialmente. À parte este contexto histórico, o dia nos incita a refletir sobre as causas e os porquês das muitas barreiras que ainda impedem a igualdade de oportunidades entre mulheres e homens nas diversas esferas da sociedade.

No caso brasileiro, a cultura machista, que impera desde a formação do país enquanto nação e povo, foi a grande responsável pela manutenção da ordem social sexista e misógina por todos esses séculos. Infelizmente, o machismo ainda hoje continua no imaginário e na psique coletiva do nosso tecido social. 

Devido a essa contaminação histórica na “alma” do povo brasileiro, a grande maioria dos homens reproduz, algumas vezes sem perceber e na maioria das vezes motivados pelo machismo que os faz acharem-se superiores às mulheres, conceitos e comportamentos sexistas, discriminatórios. Triste também é ver mulheres – sim, mulheres! – que endossam atitudes machistas contra elas mesmas, muitas vezes sem sequer atentar para o quão estão indo de encontro à própria causa. 


A cultura machista do brasileiro, amparada por uma sociedade historicamente patriarcal, legitimou, ao longo dos séculos, e legitima ainda hoje, que muita discriminação e injustiças sejam cometidas contra as mulheres em nome da imposição de uma pseudo moral, na qual estas devem obediência – entenda-se subserviência – aos homens: “os donos da razão e da verdade”, sob pena de serem humilhadas, maltratadas, rejeitadas socialmente, e até mesmo espancadas e mortas, vide o alto número de feminicídio (crime cometido por um homem contra uma mulher a qual considera sua propriedade) no país. 


Vale lembrar que o número de feminicídios no Brasil é preocupante. O caso midiático da garota Eloá, que foi morta pelo seu ex-namorado por este não aceitar o fim do relacionamento, é emblemático para explicar o avanço de feminicídio no país, em que pese a cobertura jornalística desastrosa da imprensa à época e quando do julgamento do assassino, que somente reforçou a misoginia e o machismo velado que imperam na estrutura psicossocial do povo brasileiro. Em ambas as situações, a cobertura midiática prendeu-se meramente ao crime em si, esquivando-se de ampliar o debate para temas como feminicídio, machismo, patriarcalismo, ou seja, questões que explicam o comportamento do agressor. 


De acordo com a Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), órgão do Governo Federal, uma em cada cinco brasileiras já sofreu algum tipo de violência por parte de um homem. Ademais, estatísticas da mesma Secretaria mostram que, a cada 15 segundos, uma mulher é espancada no Brasil, o que representa cerca de 2 milhões de casos por ano. Números absurdos e revoltantes que precisam ser pronta e eficazmente combatidos.


Em meio a esta realidade, percebe-se que o Estado brasileiro vem tentando arrostar essa situação, ainda que timidamente e muito aquém do necessário. Atualmente, segundo a SPM, existem 889 serviços especializados para atender mulheres vítima de violência, sendo 464 delegacias, 165 Centros de Referência, 89 juizados especializados em violência doméstica e familiar, 72 Casas-Abrigo, 58 defensorias e 21 promotorias especializadas, além de 12 serviços de responsabilização e educação do agressor. Sem falar na Lei Maria da Penha, que em 2011 completou cinco anos, e já foi responsável por mandar para a jaula... ops, para a cadeia muitos homens que agrediram mulheres. 

No entanto, além desse índice alarmante de violência a que são submetidas, as mulheres, para piorar a situação, embora tenham avançado nas útimas décadas, ainda possuem uma representação bem abaixo dos homen nas instâncias políticas de poder e decisão, seja no Legislativo, no Judiciário ou no Executivo.

Em 2012, completam-se 80 anos que as mulheres tiveram direito a voto no Brasil. Sim, porque – pasmem! - a tarefa de eleger os nossos representantes nas instâncias políticas já foi exclusividade masculina. No entanto, a comemoração precisa ser feita com ressalvas. Porque  80 anos após conquistarem o direito ao voto, apesar de representarem 52% do eleitorado brasileiro (mais da metade, portanto), apenas 46 dos 513 deputados da Câmara são mulheres, algo em torno de 9%, somente 12 dos 81 senadores são do gênero feminino, o que representa cerca de 15%. Na Assembleia Legislativa do Ceará, dos 46 parlamentares, apenas 9 são mulheres, 19% do total; e na Câmara Municipal de Fortaleza, dos 41 vereadores, somente 4 são mulheres, nem 10% da Casa.  

As desigualdes e a discriminação não param por aí. No mercado de trabalho, saltam à vista as diferenças de salários entre os gêneros, mesmo quando exercem a mesma função.  Para citar um exemplo, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), segundo levantamento da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS), em 2011 as mulheres ganhavam em média 72% da remuneração mensal masculina. O rendimento médio dos  homens da RMF era de R$ 1.056 ao passo que o das mulheres era de R$ 761. Ainda na RMF, o desemprego feminino alcança índices maiores que o dos homens. Ademais, para cada mulher com carteira assinada, há três sem qualquer vínculo contratual. Essa situação se repete em todo o Brasil, em maior ou menor escala.

Para tentar dar um basta a este absurdo, nesta semana, a Comissão de Direitos Humanos do Senado (CDH) aprovou, em caráter terminativo (sem necessidade de votação em plenário), Projeto de Lei que pune as empresas que pagarem salário menor para as mulheres contratadas para realizar a mesma atividade executada por empregados homens. O PL segue agora para sanção da presidenta Dilma, desde que não haja pedido de nenhum parlamentar para que a proposta seja apreciada em plenário.

Em suma, a realidade para as mulheres, no Brasil - e, por extensão, em todo o mundo -, não obstante o avanço visível das conquistas do movimento feminista nas últimas décadas, ainda é eivada de muito preconceito, discriminação e descrédito. Será preciso, portanto, que gerações e mais gerações doravante combatam a raiz podre dessa sociedade machista, misógina e patriarcal que impera na estrutura psicossocial do povo brasileiro e atavicamente foi determinante para excluir as mulheres dos processos políticos e sócio-econômicos do país. Hoje, mais do que em qualquer outro dia, pensemos nisso!