quinta-feira, 29 de março de 2012

A construção social da "raça" negra

Aos traficantes de escravos interessava unificar as diversas etnias africanas dentro de uma mesma classificação: a "raça" negra (Gravura: Escravas negras de diferentes nações; Debret, 1835)

*Artur Pires

Vamos dar início aqui no Impressões Mundanas a uma discussão acerca de negritude: suas lutas, seus desafios, sua construção sócio-histórica etc. Para embasar nossos textos - esse e outros que virão, faremos uso de fontes da monografia Cotas raciais: políticas afirmativas para reparação de uma dívida histórica, apresentada à Pró-Reitoria de Pesquisa e Pós-Graduação da Universidade Federal do Ceará (UFC), no curso de Especialização em Docência do Ensino Superior. Para começar, vamos analisar como se deu o processo de construção social da “raça” negra no Brasil.

De antemão, cabe ressaltar que, em termos biológicos, a cor da pele é determinada pela quantidade e tipo do pigmento melanina presente na derme, e que sua variação é controlada por apenas quatro a seis genes1. Assim, “este número de genes poderia ser considerado extremamente insignificante, ao menos do ponto de vista quantitativo, diante dos 35 mil genes existentes no genoma humano1” (p. 10). A partir desse breve preâmbulo, poderá se compreender melhor como se deu a construção social do conceito de “raça” negra.

Desde os primeiros anos do tráfico negreiro, os lucros dos traficantes portugueses com a atividade eram vultosos. O comércio de pessoas vindas da África tinha se mostrado essencialmente eficaz, do ponto de vista de mão-de-obra para as lavouras de cana-de-açúcar, e altamente rentável, sob o prisma econômico. Os negros vinham principalmente do centro-oeste africano, de regiões onde hoje se localizam o Sudão, Angola, Guiné e o Congo, e pertenciam, principalmente, a dois grupos étnicos: sudaneses (nagôs) e bantos.

É importante analisar que nesses primeiros anos no Brasil, os escravos trazidos da África não se reconheciam como negros tampouco vislumbravam o continente africano, em sua totalidade, de forma homogênea, mas tinham esse sentimento de pertença somente às suas regiões de origem específicas, ou seja, se reconheciam enquanto bantos, sudaneses (nagôs), zulus, mas não se viam como africanos.

Entre os séculos XVI e XIX, os habitantes das muitas regiões africanas não se percebiam em absoluto como ‘negros’. “‘Negros’ foi de algum modo uma construção ‘branca’, já que os povos africanos enxergavam a si mesmos como pertencentes a grupos étnicos bem diferenciados e em certos casos reciprocamente hostis1” (p. 39 e 40). No entanto, “[...] para que uma parte da população brasileira pudesse passar a se ver como negra foi preciso que o africano trazido ao Brasil como escravo deixasse de enxergar a si mesmo como zulu, mandinga ou nuer1 (p. 14).

A capoeira, como outras manifestações de origem africana/escrava,  era vista com muita discriminação pela sociedade à época (Gravura: Dança de Guerra; Rugendas, 1835)

Desse modo, a construção social do negro foi engendrada a partir da igualização - ou da indiferenciação - de uma série de outras diferenças étnicas que demarcavam as identidades locais no continente africano. Barros (2009) esclarece que, da mesma maneira, construída também foi a noção de um continente africano homogêneo e uno:
                
Se a idéia do negro foi construída por supressão ou minimização das diferenças tribais, é preciso salientar que os negros africanos tampouco se viam como ‘africanos’. A ‘África’ foi também uma construção da ‘Europa’. O norte, o centro, o sul, a banda oriental, o litoral atlântico, para apenas falar das macrorregiões da África, eram pressentidas pelos povos que as habitavam como regiões geográficas e culturais bem diferenciadas. Quem pela primeira vez avaliou estes povos a partir de uma identidade étnica e continental enquadrada em um lugar único foi o próprio homem ‘branco’ europeu, já que esta questão não se colocava então para os ‘negros africanos’ da época (p. 40).

Para os colonizadores, desconsiderar as diferenças internas entre as regiões africanas e, por conseguinte, a complexidade de etnias que o “continente africano” representava era, de certa maneira, uma forma de mostrar o desprezo do europeu para com a riqueza cultural do povo africano. A fórmula simplista – e racista - estava pronta: enquadrar um grande continente para uma grande e única categoria de negros.

Aos invasores e traficantes de escravos portugueses e de outras nações européias interessava dar vazão e difundir a noção de uma África selvagem, de um homem negro atrasado cultural e socialmente. Assim, essa visão eurocêntrica do continente e do povo africano começou a fazer parte do imaginário coletivo, dando estímulo ao tráfico negreiro e à exploração de uma nova força de trabalho submetida às mais degradantes condições, com as devidas bênçãos da Igreja Católica.

“[...] Construir a idéia do ‘negro’ como realidade que transcende todas as etnias, que as supera ou mesmo as cancela, era precisamente o procedimento-chave1” (p. 47 e 48).  O negro passou a ser visto “como uma realidade única e monolítica, e com o tempo foi levado a enxergar a si mesmo também desta maneira1” (p. 48). Assim sendo, [...] a desconstrução da diversidade de etnias negras e das realidades culturais africanas, mergulhando-as dentro de uma grande raça localizada em um espaço geográfico único e imaginariamente homogêneo e a simultânea visão desta parte da humanidade como ‘inferior’, ao mesmo tempo em que se encarava o continente africano como lugar exterior à ‘civilização’ [...] constitui o fundo ideológico da montagem do sistema escravista no Brasil1 (p. 45 e 46).

Dessa maneira, após construírem socialmente o conceito de “raça” negra e de um continente africano homogeneizado, desnudo de diferenças tribais e étnicas e dotado de uma unicidade ímpar, cabia agora aos colonizadores europeus, para efeito de justificar sua dominação e exploração sobre os negros, atestarem “cientificamente” a inferioridade desta mesma “raça”. Mas esse é assunto para um próximo texto.

1. BARROS, José D´Assunção. A construção social da cor: diferença e desigualdade na formação da sociedade brasileira. Petrópolis, Vozes, 2009.  

* Artur Pires é cafuzo (negro + índio) e tem muito orgulho de sua ancestralidade


quinta-feira, 8 de março de 2012

Às Rosas, Dandaras, Olgas e Pagus que vivem em cada uma das mulheres!


À luta, mulheres! (Ilustração: Klévisson Viana)

* Artur Pires

Hoje, 8 de março, comemora-se o Dia da Mulher. Uma data para homenagear as mulheres foi pensada pela primeira vez em 1910, durante a  Segunda Internacional Socialista, em Copenhague, na Dinamarca. Em 1917, no dia 8 de março, milhares de mulheres russas saíram às ruas para protestar contra a escassez e o alto o alto preço dos alimentos. Os protestos foram se avolumando nos dias seguintes e hoje são considerados o estopim para o início da Revolução Russa naquele mesmo ano. Quatro anos mais tarde, em 1921, o 8 de março foi oificalizado como o Dia da Mulher. Apenas em 1975, a Organização das Nações Unidas (ONU) reconheceu a data oficialmente. À parte este contexto histórico, além de comemorar, o dia nos incita a refletir sobre as causas e os porquês das muitas barreiras que ainda impedem a igualdade de oportunidades entre mulheres e homens nas diversas esferas da sociedade.

No caso brasileiro, a cultura machista, que impera desde a formação do país enquanto nação e povo, foi a grande responsável pela manutenção da ordem social sexista e misógina por todos esses séculos. Infelizmente, o machismo ainda hoje continua no imaginário e na psique coletiva do nosso tecido social.

Devido a essa contaminação histórica na “alma” do povo brasileiro, a grande maioria dos homens reproduz, algumas vezes sem perceber e na maioria das vezes motivados pelo machismo que os faz acharem-se superiores às mulheres, conceitos e comportamentos sexistas, discriminatórios. Triste também é ver mulheres – sim, mulheres! – que endossam atitudes machistas contra elas mesmas, muitas vezes sem sequer atentar para o quão estão indo de encontro à própria causa.

A cultura machista do brasileiro, amparada por uma sociedade historicamente patriarcal, legitimou, ao longo dos séculos, e legitima ainda hoje, que muita discriminação e injustiças sejam cometidas contra as mulheres em nome da imposição de uma pseudo moral, na qual estas devem obediência – entenda-se subserviência – aos homens: “os donos da razão e da verdade”, sob pena de serem humilhadas, maltratadas, rejeitadas socialmente, e até mesmo espancadas e mortas, vide o alto número de feminicídio (crime cometido por um homem contra uma mulher a qual considera sua propriedade) no País.

Vale lembrar que o número de feminicídios no Brasil é preocupante. O caso midiático da garota Eloá, que foi morta pelo seu ex-namorado por este não aceitar o fim do relacionamento, é emblemático para explicar o avanço de feminicídio no país, em que pese a cobertura jornalística desastrosa da imprensa à época e quando do julgamento do assassino, que somente reforçou a misoginia e o machismo velado que imperam na estrutura psicossocial do povo brasileiro. Em ambas as situações, a cobertura midiática prendeu-se meramente ao crime em si, esquivando-se de ampliar o debate para temas como feminicídio, machismo, patriarcalismo, ou seja, questões que explicam o comportamento do agressor.

De acordo com a Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), órgão do Governo Federal, uma em cada cinco brasileiras já sofreu algum tipo de violência por parte de um homem. Ademais, estatísticas mostram que, a cada 15 segundos, uma mulher é espancada no Brasil, o que representa cerca de 2 milhões de casos por ano. Números absurdos e revoltantes que precisam ser pronta e eficazmente combatidos.

Em meio a esta realidade, percebe-se que o Estado brasileiro vem tentando arrostar essa situação, ainda que timidamente e muito aquém do necessário. Atualmente, segundo a SPM, existem 889 serviços especializados para atender mulheres vítima de violência, sendo 464 delegacias, 165 Centros de Referência, 89 juizados especializados em violência doméstica e familiar, 72 Casas-Abrigo, 58 defensorias e 21 promotorias especializadas, além de 12 serviços de responsabilização e educação do agressor. Sem falar na Lei Maria da Penha, que em 2011 completou cinco anos, e já foi responsável por mandar para a jaula... ops, para a cadeia muitos homens que agrediram mulheres. 

No entanto, além desse índice alarmante de violência a que são submetidas, as mulheres, para piorar a situação, embora tenham avançado nas útimas décadas, ainda possuem uma representação bem abaixo dos homen nas instâncias políticas de poder e decisão, seja no Legislativo, no Judiciário ou no Executivo.

Em 2012, completam-se 80 anos que as mulheres tiveram direito a voto no Brasil. Sim, porque – pasmem! - a tarefa de eleger os nossos representantes nas instâncias políticas já foi exclusividade masculina. No entanto, a comemoração precisa ser feita com ressalvas. Porque  80 anos após conquistarem o direito ao voto, apesar de representarem 52% do eleitorado brasileiro (mais da metade, portanto), apenas 46 dos 513 deputados da Câmara são mulheres, algo em torno de 9%, somente 12 dos 81 senadores são do gênero feminino, o que representa cerca de 15%. Na Assembleia Legislativa do Ceará, dos 46 parlamentares, apenas 9 são mulheres, 19% do total; e na Câmara Municipal de Fortaleza, dos 41 vereadores, somente 4 são mulheres, nem 10% da Casa.  

As desigualdes e a discriminação não param por aí. No mercado de trabalho, saltam à vista as diferenças de salários entre os gêneros, mesmo quando exercem a mesma função.  Para citar um exemplo, na Região Metropolitana de Fortaleza (RMF), segundo levantamento da Secretaria do Trabalho e Desenvolvimento Social (STDS), em 2011 as mulheres ganhavam em média 72% da remuneração mensal masculina. O rendimento médio dos  homens da RMF era de R$ 1.056 ao passo que o das mulheres era de R$ 761. Ainda na RMF, o desemprego feminino alcança índices maiores que o dos homens. Ademais, para cada mulher com carteira assinada, há três sem qualquer vínculo contratual. Essa situação se repete em todo o Brasil, em maior ou menor escala.

Para tentar dar um basta a este absurdo, nesta semana, a Comissão de Direitos Humanos do Senado (CDH) aprovou, em caráter terminativo (sem necessidade de votação em plenário), Projeto de Lei que pune as empresas que pagarem salário menor para as mulheres contratadas para realizar a mesma atividade executada por empregados homens. O PL segue agora para sanção da presidenta Dilma, desde que não haja pedido de nenhum parlamentar para que a proposta seja apreciada em plenário.

Em suma, a realidade para as mulheres, no Brasil - e, por extensão, em todo o mundo -, não obstante o avanço visível das conquistas do movimento feminista nas últimas décadas, ainda é eivada de muito preconceito, discrimiinação e descrédito. Será preciso, portanto, que gerações e mais gerações doravante combatam a raiz podre dessa sociedade machista, misógina e patriarcal que impera na estrutura psicossocial do povo brasileiro e atavicamente foi determinante para excluir as mulheres dos processos políticos e sócio-econômicos do país. Hoje, mais do que em qualquer outro dia, pensemos nisso! E, mais do que nunca, viva, viva as Mulheres!!

*Artur Pires acredita e defende a luta feminina por igualdade de oportunidades e direitos

Abaixo, segue música "Mulher Guerreira", do grupo de rap Atitude Feminina, composto só por mulheres. No clipe, elas recebem a companhia do grupo Inquérito. 

Letra aqui.

quinta-feira, 1 de março de 2012

Futebol, corrupção e poder: tudo a ver!

O "ditador" Teixeira não larga o osso..ops, a bola ($$$)! (Charge: Mário Alberto) 

* Artur Pires

Na última terça-feira, 28 de fevereiro, um apático, sonolento e completamente desfigurado e desalmado Brasil venceu a Bósnia por 2 a 1, com um gol contra já no final da partida. Não é de hoje que a Seleção vem, jogo após jogo, maltratando o torcedor brasileiro com sucessivas atuações terríveis, bem abaixo, mas muito abaixo da média. Logo nós, brasileiros, tão acostumados a vermos esquadrões da Seleção que encantavam tamanha a envolvência, habilidade e criatividade que dispensavam à bola, que praticavam o futebol-arte, repleto de dribles, gingas e jogadas inventivas, assim como deve ser, de fato, esse esporte. Que o digam as gerações anteriores à minha geração oitentista, que viram o timaço de 1982, com Sócrates, Zico e Falcão, e a Seleção do Tri, de 1970, com Pelé, Tostão e Rivelino. Ainda acompanhamos o baixinho Romário carregar nas costas um time mediano em 1994 e Rivaldo e o Fenômeno também resolverem por conta própria em 2002. De lá para cá, madeeeeeeiraaaa! A Seleção e seu futebol despencaram.

Não vou aqui posar de saudosista sem causa, mas penso que a atual Seleção, e seu modo sem alma de jogar e se relacionar com o torcedor brasileiro, é reflexo direto da maneira como o futebol é hoje conduzido no mundo e, agravadamente, no Brasil: um meganegócio. Falando em meganegócio ($$$), notícia quentinha: após uma reunião a portas fechadas com presidentes das federações estaduais de futebol, ficou decidido que o todo-poderoso Ricardo Teixeira, presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) desde 1989, vai continuar à frente da entidade, após semanas na corda bamba, naquele cai-não-cai, com a mídia nativa dando como certa a sua saída, após estourarem denúncias na imprensa mundial vindas de um jornalista investigativo britânico, Andrew Jennings, que em seu livro, "Jogo Sujo - O Mundo Secreto da Fifa", deu conta de falcatruas milionárias do presidente da CBF. No fim, Teixeira não caiu! Para o nosso azar!

O presidente da Confederação e seus capachos na CBF, bajuladores e apalpadores de plantão, são os maiores responsáveis pela decadência do futebol brasileiro, pela transformação de um futebol que já foi arte em mero jogo de interesses escusos. Claro que o processo de mercantilização do futebol não é exclusividade do Brasil, mas aqui, diferentemente de outros países, o poder de decisão sobre o esporte e sobre os investimentos de centenas de milhões de dólares nele aportados ficaram concentrados nas mãos de uma única pessoa: sim, ele mesmo, o poderoso chefão brasileiro!

Ricardo Teixeira fez um dos maiores males ao País ao retirar a identidade da Seleção com o seu povo. Primeiro, o Brasil não joga mais no.... Brasil. Sim, o todo-poderoso levou os jogos da equipe pentacampeã para a Europa, com a alegação de que, como a maioria dos jogadores joga por lá mesmo, seria melhor em relação ao deslocamento. Pura falácia. O que Teixeira esconde é que jogando em estádio A ou B na Europa, a CBF engorda seus cofres com vultosas quantias de dólares/euros, pagas por patrocinadores os mais diversos. Trocando em miúdos, um jogo da Seleção no Brasil não seria tão lucrativo como é um jogo da Seleção na Europa. Danem-se os torcedores brasileiros! O que vale é a bufunfa! Sem falar nos amistosos caça-níqueis contra times do quinto escalão do futebol mundial, como a Bósnia, por exemplo, mas que pagam uma boa grana para jogar contra o Brasil. Contando com a total complacência dos jogadores brasileiros, que não demonstram um mínimo de senso crítico diante do exposto, Teixeira foi, maquiavelicamente, diminuindo a estima do brasileiro pela sua Seleção ao passo em que ia aumentando a sua conta bancária.

Jogadores como o ídolo adolescente Neymar, que, embora jogue muita bola, se mostra mais preocupado com o cabelo moicano e com seus contratos publicitários do que em servir de contraponto à ditadura Teixeira, retratam bem a alienação política dos boleiros brasileiros atuais, que nada contestam e apenas servem de estepe para que o todo-poderoso se perpetue no poder. Que o diga Ronaldo, o Fenômeno, nomeado por Teixeira presidente do Comitê Organizador da Copa. Que falta faz um Sócrates numa hora dessas!

Copa de 2014: Pra frente Brasil?

Copa e corrupção lado a lado no país do futebol! (Charge: Luke)

Em relação à Copa de 2014 no Brasil, o que não vai faltar são oportunidades para fraude e superfaturamento em licitações, desvios de recursos públicos, subornos de toda ordem, entre outras falcatruas para que atores dessa peça de corrupção encham os bolsos. E olhe que não sou contra a Copa no Brasil. Acho, inclusive, que o evento tende a trazer para as cidades sedes, em curto espaço de tempo, por força de contrato com a Federação Internacional de Futebol (FIFA), uma infraestrutura social e urbana que demoraria décadas para ser viabilizada. Com a ressalva maior de que as comunidades que morem no entorno dos estádios ou das obras infraestruturantes sejam respeitadas à risca nos seus direitos.

O que não se pode permitir é que um torneio dessa magnitude tenha como manda-chuva um personagem tão envolvido em escândalos e casos de corrupção. O que não se pode aceitar é que a FIFA, entidade também nada confiável, envolta em corruptelas e desmandos, tal qual uma Cosa Nostra do futebol, suplante a legislação do País e imponha suas regras próprias para a realização do evento. O que não se pode aceitar é que, em nome da Copa de 2014, comunidades sejam despejadas de suas casas, sem o mínimo respeito com a dignidade humana, para dar lugar à “modernização”.

Enfim, o futebol brasileiro, tão rico que é de conquistas e glórias, merece uma melhor administração. A CBF, antiga Confederação Brasileira de Desportos (CBD), que se tornou atualmente essa megaempresa dona do futebol brasileiro, necessita urgentemente alterar seu estatuto e passar a ser administrada por pessoas que entendam e vejam o futebol como um esporte de pura magia, arte, contemplação e lazer. E, claro, que respeitem a alternância de comando, que realizem eleições regulares a cada dois anos para presidente, diretoria, conselho deliberativo e demais instâncias administrativas. Democracia já para a CBF! Democracia e resgate já para o futebol brasileiro!

Em síntese, o futebol brasileiro não é mais o mesmo. A Seleção não é mais a mesma. A relação do torcedor brasileiro com a Seleção, infelizmente, também não é mais a mesma. Mas Teixeira, esse sim, ainda é o mesmo de quando assumiu a CBF, no longínquo 1989: um empresário mais ávido por lucro e poder do que abutre por carniça. Fora Teixeira! Pelo bem do futebol brasileiro! Pelo bem do Brasil!
 



*Artur Pires é um amante do futebol-arte