A mídia nutre verdadeira ojeriza a movimentos socias e de trabalhadores (Charge: Rafa)
Artur Pires
Na última terça-feira (29), após
episódio em frente ao jornal Diário do Nordeste, os fortalezenses foram
bombardeados com notícias acerca do quebra-quebra que resultou com a vidraçaria
da fachada do jornal vindo abaixo, após confronto entre seguranças do DN e
trabalhadores de dois segmentos – gráficas e construção civil - em greve. Em
todos os veículos de comunicação que noticiaram o ocorrido, uma unanimidade: a
criminalização do movimento paredista. De fato, as imagens são bastante
contundentes: trabalhadores estilhaçando com pedras a vidraça do jornal. No
entanto, vale a ressalva, nem tudo o que parece é.
Os jornais, o DN incluso
(lógico!), apressaram-se a contar o ocorrido estritamente sob a ótica dos donos
da empresa. Parlamentares foram contatados para expressar seu repúdio com a
“selvageria” dos trabalhadores grevistas. Na cobertura dos fatos pelos
noticiosos, coincidentemente - ou não? -, outra unanimidade: não foi ouvido o
outro lado do ocorrido. Quando muito, uma ou duas linhas escondidas para a
versão dos trabalhadores em greve em meio a páginas inteiras de ataques e
acusações furiosas contra os mesmos e seus movimentos. Na tevê, a cobertura foi
ainda mais tendenciosa, uma vez que os sindicatos da construção civil e dos
gráficos sequer foram ouvidos.
Nós, jornalistas, aprendemos
ainda nos primeiros semestres de faculdade uma lição básica da futura profissão
que abraçaremos: ouvir os dois (ou três, quatro, quantos houver) lados da
notícia. Lembro bem do meu professor e mestre, Agostinho Gósson, falando
insistentemente para termos sempre o cuidado de escutar as diferentes versões
que, por ventura, possam haver de um mesmo acontecimento. Não é o que fazem os
“jornalões” da mídia empresarial, representados aqui no Ceará pelo O Povo
(grupo Demócrito Rocha) e, principalmente, pelo Diário do Nordeste (grupo Edson
Queiroz).
Desde o início da greve dos
operários da construção civil e, mais recentemente, dos gráficos, a tônica do
noticiário é uma só: criminalizar os movimentos, taxando seus trabalhadores
grevistas de vândalos, baderneiros, selvagens, arruaceiros, mesmo sendo a greve
um direito legítimo amparado por Lei Federal. Não é de hoje que a mídia
empresarial usa desses artifícios para lançar a sociedade contra movimentos sociais
e dos trabalhadores. Os leitores, ouvintes e telespectadores quase sempre
acreditam piamente em tudo o que leem, escutam e assistem – e assim a versão da
imprensa convencional é assimilada como “verdade absoluta”. Afinal, a mídia não
tem por que mentir, não é? É aí que a gente se engana. A grande mídia (que de
grande, em termos éticos, morais e humanos, não tem nada) produz notícia a
partir dos interesses de seus grupos empresariais. Para estes grupos, movimentos
sociais, sindicais e grevistas não são interessantes às suas conveniências, uma
vez que esses movimentos, quando não cooptados pelo status quo, contestam a ordem social excludente e injusta que essa
mesma mídia tenta, a todo custo, conservar.
O caso da última terça-feira é
emblemático. De antemão, quero deixar claro que sou veementemente contrário ao
uso da força bruta e da violência para se conquistar algo na esfera sindical:
acredito na luta de classes, na mobilização, na união, na negociação e na GREVE
como pontes fundamentais para avanços trabalhistas e salariais, seja qual for a
categoria. Portanto, acho que os grevistas erraram feio ao agredirem fotógrafos
na última semana e apedrejarem a vidraçaria do Diário. Com essas atitudes, só
municiam a mídia para atacá-los e, consequentemente, enfraquecer seus
movimentos, que, reitero, são justos e legítimos.
Em relação aos ataques a
fotógrafos do DN e d´O Povo na última semana, conheço apenas as versões oficiais
dos jornais – e a partir delas faço a crítica às cegas (posso estar, inclusive,
sendo injusto, uma vez que não tomei conhecimento da versão dos trabalhadores
grevistas). No entanto, o que poucos sabem até agora é que, segundo o Sindicato
dos Gráficos do Ceará e o Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil da
Região Metropolitana de Fortaleza, o confronto da última terça-feira foi
iniciado após um dos seguranças do Diário do Nordeste ser visto com uma grande pedra
na mão pronto para arremessá-la. Rapidamente, um grevista partiu para cima do
segurança tentando impedi-lo de lançar a pedra contra a multidão de
trabalhadores. Nesse momento, o trabalhador foi agarrado e arrastado para o
interior do jornal. A resposta dos paredistas foi tentar invadir o DN para
retirar o trabalhador “preso”.
Depois desse momento, o que se
viu foi o confronto e o quebra-quebra entre grevistas e seguranças. Sem ter
feito esforço nenhum, o Diário do Nordeste ganhava de mãos beijadas e vidraças
quebradas a manchete de capa e o editorial do dia seguinte. Mais do que isso: agora,
sim, ele podia provar o quanto esses trabalhadores são “selvagens”. Afinal, o
que são poucos mil reais para reparar uma simples vidraça perto da condenação
moral e da execração pública que os trabalhadores iriam enfrentar daquele dia
em diante. Maquiavélico, não? Pois é! Mas qualquer semelhança com jornais que
você costuma ler e assistir NÃO é mera coincidência.
Reproduzo abaixo nota conjunta do Sindicato dos Gráficos do Estado do
Ceará e do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil da Região Metropolitana
de Fortaleza
QUANDO A LIBERDADE SERVE APENAS PARA UM GRUPO SOCIAL, NÃO É LIBERDADE DE IMPRENSA E NEM LIBERDADE PLENA.
Nos últimos 23 dias de greve
dos operários da construção civil e 13 dias de greve dos trabalhadores
gráficos, vimos claramente a quem servem os donos da mídia, e não é a sociedade
como um todo.
A mídia de uma sociedade
democrática deve primar por princípios éticos que garantam transparência e
primem pela verdade dos fatos. Boa parte da mídia no Ceará prima por seus
próprios interesses econômicos e sociais. Repetindo uma velha forma de
reprodução do discurso hegemônico sobre os movimentos sociais: a total exclusão
ou a criminalização.
Em 13 dias de greve dos
trabalhadores gráficos, a sociedade só obteve informação desse processo de luta
quando foi interessante responsabilizar uma categoria inteira e sua direção
sindical por um ato motivado pela segurança da própria empresa. A luta
dos gráficos não existia, ao menos para os leitores cearenses, porque para a
categoria que enfrentou práticas ilegais como substituição de grevistas e até o
confinamento, ela existe e serve para que pais e mães de família lutem por
melhores condições de vida e de trabalho.
E em 23 dias de greve dos
operários da construção civil, vimos como é possível a criminalização de um
movimento. Embora a direção da entidade repita constantemente que não incentiva
violência, que não fornece bebidas alcoólicas e que defende a liberdade de
imprensa, o que vemos é a constante reprodução de notícias que tratam os
grevistas como baderneiros, vândalos e bêbados. Chegou-se ao ponto de se
mostrar um trabalhador fumando cigarro Maratá e insinuar que se tratava de um
cigarro de maconha.
Imagens de antigos processos
de luta são utilizadas para insinuar quebradeira, imagens de funcionários do
sindicato fechando um portão são usadas com o mesmo intuito. Uso de câmeras
ocultas. Alegações de agressão e vandalismo, sem comprovação de imagem. E
tantas outras formas de manipulação da informação que já foram denunciadas em
nota pela entidade sindical.
Generalizam-se as exceções. E
o que as entidades solicitam? Que mostrem o que está errado, mas não esqueçam a
imparcialidade, consultem os dois lados e não acusem sem provas.
Mas, ontem (29/05), a
superação de como a imprensa pode julgar fatos chegou ao seu ápice, buscaram
declarações de personalidades do Estado, que se pronunciaram sem ao menos ouvir
os dois lados, e, diga-se de passagem, pessoas que em tanto tempo de luta
desses trabalhadores, jamais se manifestaram em defesa dessas categorias.
Por que nenhum desses
entrevistados questionou as 28 mortes acontecidas nos canteiros de obra de 2011
até hoje? Por que nenhuma delas questionou por que foram substituídos os
grevistas gráficos com contratação de outros trabalhadores? Por que em nenhum
momento colocaram-se na defesa da luta dos trabalhadores, ou pediram que os
patrões mostrem-se mais dispostos em negociar?
Quanto ao dia de ontem, mais
uma vez vimos como uma história pode ser construída. Através desta nota,
tentamos esclarecer a sociedade e aos jornalistas (trabalhadores), sobre os
fatos:
1- O trio elétrico da entidade, onde se encontravam a direção das entidades,
cruzava a rua lateral do jornal, quando teve inicio o confronto entre a
segurança contratada pelo Diário do Nordeste e alguns trabalhadores;
2- O confronto foi iniciado, pois segundo informações colhidas pela direção do
sindicato junto aos trabalhadores, um segurança do jornal teria tirado uma
pedra do jardim e chegou a ser orientado para trocar por uma maior;
3- A tentativa de segurar uma pedra, foi impedida por um trabalhador que segurado
pelo braço, foi sendo arrastado para o interior do jornal;
4- Foi quando a categoria enfrentou a segurança;
5- Mesmo assim, o presidente do Sindicato dos Gráficos pegou o microfone do carro
de som e gritando aos manifestantes pediu que as categorias recuassem e não
caíssem em qualquer tipo de provocação;
6- Membros da direção do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil fizeram
com seus corpos uma corrente de proteção ao Diário do Nordeste para conter a
situação, ironicamente a foto dos dirigentes fazendo a corrente foi capa do
próprio jornal;
7- O assessor político do Sindicato dos Trabalhadores da Construção Civil,
Valdir Pereira, nunca esteve no local, ao contrário do que foi publicado.
Apesar desta cobertura fora
dos códigos de ética da profissão dos jornalistas. As duas entidades sindicais
mais uma vez vêm a público afirmar, que não incentivam violência contra
jornalistas e são defensores da liberdade de imprensa (o que é diferente de
liberdade de mentira ou de liberdade de empresa).
A revolução não será
televisionada...
- Sindicato dos Gráficos do
Estado do Ceará
- Sindicato dos Trabalhadores
na Construção Civil da Região Metropolitana de Fortaleza